Um novo lançamento vem complementar o que já tinha sido um bom ano para a historiografia econômica da América Latina, como ilustra a publicação em outubro de 2010 do livro organizado por Salvatore, Coatsworth e Challu, Living Standards in Latin American History: Height, Welfare, and Development, 1750-2000. Camb., Mass., Harvard University Press, 2010. Nesse livro, inclusive, Claudio Shikida, Leonardo Monastério e Luis Paulo Nogueirol colaboraram com um capítulo, com um estudo antropométrico inédito sobre o Brasil entre as décadas de 1930 e 1980.
Agora, bem ao final de 2010, Luis Bértola e José Antonio Ocampo lançaram uma nova obra que promete tornar-se uma das principais referências sobre a história econômica da América Latina: Desenvolvimento, Vicissitudes e Desigualdade: Uma História Econômica da América Latina desde a Independência. Este livro junta-se aos de Victor Bulmer-Thomas e Rosemary Thorp como as melhores introduções à história econômica da América Latina disponíveis em um único volume.
O novo livro de Bértola e Ocampo apresenta uma síntese do desenvolvimento econômico da América Latina, desde as independências das novas nações no início do século XIX até os dias de hoje. Uma das tarefas mais difíceis em uma obra geral deste tipo é equilibrar uma análise do conjunto do que se chama convencionalmente de América Latina – marcada por uma enorme heterogeneidade étnica, cultural, econômica e institucional – com as histórias dos países que a compõem. O livro de Bértola e Ocampo é um dos mais bem-sucedidos nesse aspecto, com um tratamento detalhado das economias individuais que qualificam e ilustram os diferentes caminhos e resultados da história econômica dos países latino-americanos.
Chama a atenção no livro a riqueza dos dados macroeconômicos, apresentados sempre em uma perspectiva comparativa e articulada aos grandes eventos internacionais. Além de bases de dados da Cepal e de outros autores, Bértola e Ocampo compilam e utilizam estimativas próprias de vários indicadores comparativos que dão uma contribuição que já por si garante um lugar especial ao livro na historiografia econômica da América Latina.
A riqueza dos dados não ofusca o que é o objetivo principal dos autores: apresentar uma síntese que contemple os aspectos institucionais e históricos dos países latino-americanos de forma integrada à análise quantitativa. O conhecimento demonstrado pelos autores das realidades dos diferentes países é um dos pontos altos do livro. A maioria dos leitores chegará ao final do livro com um substancial conhecimento extra das histórias que constituem a América Latina.
Outro destaque do livro é que sua análise se estende praticamente até o final da década de 2010, com um balanço inédito e inovador do desenvolvimento econômico das últimas três décadas na América Latina. Bértola e Ocampo conseguem abordar esse período com uma perspectiva de longo prazo que salienta continuidades e rupturas com o passado, sem cair no que é talvez o mais grave vício dos estudos que se concentram em períodos recentes: a desconexão com a história, com as tendências de longo prazo, com as dimensões internacionais dos fenômenos que engolfam vários países simultaneamente, embora com respostas e resultados distintos.
Para os leitores brasileiros, esse último aspecto talvez seja um dos mais relevantes, dada a tendência arraigada de vermos a experiência histórica brasileira como algo praticamente único e desvinculado tanto do restante da América Latina quanto do conjunto da economia e da sociedade internacionais. O leitor terminará o livro de Bértola e Ocampo percebendo o quanto esse viés é limitante e equivocado.
Duas ótimas notícias adicionais para os leitores brasileiros: o livro foi publicado simultaneamente em espanhol e português; e mais importante, a versão integral está disponível para download no site da Secretaria Geral Ibero-Americana – veja aqui. Uma excelente opção para os cursos que tratam da história econômica da América Latina, na graduação e pós-graduação.
Como todo livro de abrangência tão ampla, porém, há possíveis ressalvas quanto às interpretações dos autores. Mas deixo os comentários a respeito para um próximo post.
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